O que o audiovisual e a creator economy têm em comum?
Ambos fazem parte da indústria cultural. Mas só um deles conta com um ecossistema mínimo de proteção e reconhecimento
Este texto é uma colaboração Brunch com a API - Associação das Produtoras Independentes do Audiovisual.
Criar conteúdo é trabalho. Produzir cultura também.
E por mais que as rotas pareçam diferentes, tem muita gente indo parar no mesmo lugar: tentando viver do que cria, enfrentando a precariedade, e buscando formas de existir de maneira digna no mercado digital e cultural. Criadores e produtoras têm muito mais em comum do que se imagina. E é urgente aproximar esses dois mundos.
De um lado, os criadores de conteúdo: profissionais que dominam linguagem, constroem comunidade, distribuem seus produtos nas plataformas e precisam monetizar cada etapa da cadeia. Fazendo tudo isso quase sempre sozinhos. Do outro, produtoras que há anos lidam com os mesmos desafios, mas que aprenderam que obra cultural é coisa séria, e que para sobreviver é preciso mais do que audiência: é preciso estrutura, política pública e regulação.
Existe uma falsa ideia de que o digital é uma economia à parte, que não precisa das mesmas regras, nem das mesmas proteções que regem o resto da indústria criativa. Mas isso só interessa a quem lucra mais quanto mais informal e desorganizado for o ecossistema que as abastece.
A lógica da monetização por engajamento, a ausência de contratos claros, a falta de reconhecimento autoral, a dificuldade de acesso a linhas de fomento... tudo isso é vivido diariamente por criadores e criadoras de todo o país. E tudo isso já foi vivido pelo setor audiovisual.
A diferença é que o audiovisual se organizou.
E os criadores ainda não.
O que o audiovisual tem para nos ensinar, então?
O audiovisual brasileiro já entendeu, por experiência, que não existe mercado sem política. O setor lutou (e ainda luta) por editais, leis de incentivo, regulação de streaming, representação coletiva e modelos de remuneração mais justos.
É imperfeito?
Muito.
Mas é muito mais estruturado do que o cenário atual da creator economy.
Enquanto o audiovisual disputa espaço na tela dos streamings, os criadores disputam alcance no algoritmo das plataformas. Ambos fazem parte da indústria cultural. Mas só um deles conta com um ecossistema mínimo de proteção e reconhecimento.
“No Brasil, os produtores de cinema e audiovisual lutam há décadas por melhores condições de regulação do mercado. A criação da Lei do Audiovisual, a criação da ANCINE (Agência Nacional do Cinema), e a criação da Lei da TV Paga foram todas conquistas do setor, a partir de muita luta coletiva. Atualmente, batalhamos pela aprovação da regulação do streaming - uma luta que vem sendo feito há quase dez anos, desde que as plataformas chegaram em nosso mercado. Não podemos deixar de lutar um dia sequer, pois o mercado não irá se autorregular, o que afeta de forma negativa principalmente o pequeno produtor independente. A regulação representa trabalho justo, partilhamento de receitas, defesa do direito autoral, garantia de que nossas obras cheguem ao público. É por isso que lutamos.”
Matheus Peçanha, diretor sudeste da API
Se o conteúdo que você, criador, produz vira entretenimento, educação ou narrativa para uma comunidade (a.k.a. audiência) ele é parte do mesmo tecido cultural. E deveria ter os mesmos direitos.
E como regula então?
Na Brunch, a gente acredita que regular não é censurar.
Regular é reconhecer.
É dizer: existe um trabalho aqui.
Existe uma cadeia de valor.
Existem direitos a serem protegidos e deveres a serem cumpridos.
Porque, se a gente não protege o que é nosso, quem vai?
Mas a regulação é uma conquista coletiva.
Criadores podem aprender com o setor audiovisual a construir pontes, diálogos e, principalmente, articulação institucional.
Sim, estamos falando de uma associação de criadores.
Liderada por profissionais atuantes, com o objetivo de defender interesses coletivos da classe.
“A criação de conteúdo é uma profissão solitária por si só, mas não só isso, ela está inserida nesse contexto de internet que nos instiga incessantemente à competição. Muitas vezes, a gente não só acha que está sozinho nessa, mas que está contra todo mundo. Sinto que esse é um grande obstáculo para montar articulações coletivas e lutar pelo que precisamos. Ainda assim, acredito que só avançaremos se entendermos que é uma profissão que exige seriedade e estabilidade, mesmo que, no curto prazo, nem sempre sejamos recompensados por agir da forma correta.”
Kaique Brito, ator, apresentador e criador de conteúdo
A creator economy não é uma exceção. Não basta esperar por reconhecimento permanecendo no papel passivo. É hora de se organizar. E de olhar para o audiovisual como um ótimo estudo de caso.
Você gostaria de fazer parte de uma associação de criadores?
Registre seu interesse aqui.